As redes sociais deveriam nos ajudar a fazer uma leitura melhor do mundo, comunicar seus problemas e formas de melhorá-los
O desenho dos espaços, sejam eles físicos ou virtuais, afetam diretamente como as pessoas interagem dentro dele. Assim como nos comportamos de maneiras distintas em um estádio de futebol e numa biblioteca, também mudamos nossa postura do LinkedIn para o WhatsApp. São nos espaços públicos como parques, bibliotecas e praças que pessoas das mais variadas tribos se encontram, reconhecem as desigualdades e criam um senso de pertencimento e identidade. Eles são parte fundamental para o funcionamento de sociedades plurais. E o que as redes sociais podem aprender com espaços públicos físicos? Essa é a pergunta que a organização não governamental Civic Signal se propôs a responder.
Criada por Eli Pariser, autora do best-seller O filtro invisível: o que a internet está escondendo de você, e Talia Stroud, diretora do Centro de Engajamento de Mídias da Universidade do Texas, a Civic Signal liderou uma pesquisa com mais de 10.000 usuários muito ativos de redes sociais espalhados por 20 países, Brasil incluído, para descobrir como criar espaços digitais mais saudáveis tendo como referência espaços públicos off-line. O objetivo da ONG é não só fornecer subsídios para que engenheiros, designers e empresas de tecnologia formem ambientes digitais mais inclusivos, como também estabelecer critérios objetivos para avaliar o quão amigáveis as plataformas já existentes são.
A pesquisa chegou a 14 princípios, ou sinais, como eles chamam, necessários para que espaços digitais floresçam. Eles foram agrupados em quatro blocos fundadores. São eles:
Acolhimento. Espaços virtuais precisam ser acolhedores. Eles devem convidar todos a participar, principalmente grupos marginalizados, promovendo inclusão social. Eles devem garantir também a segurança da sua comunidade contra qualquer tipo de dano, assédio ou exposição a conteúdos nocivos. O resgate da humanidade das relações virtuais deve ser sempre incentivado. E a proteção das informações pessoais precisa ser preservada.
Conexão. Plataformas precisam atuar no fortalecimento do tecido social cultivando o senso de comunidade, construindo pontes entre grupos diferentes, colaborando para estreitar laços locais e aproximando a população daqueles que estão no poder.
Compreensão. As redes sociais deveriam nos ajudar a fazer uma leitura melhor do mundo, comunicar seus problemas e formas de melhorá-los. Questões de interesse público merecem ser destacadas, assim como informação de qualidade para que as pessoas possam tomar melhores decisões. Nessa mesma linha, plataformas podem ajudar na construção de habilidades cívicas, estimulando os cidadãos a formarem suas opiniões e a apoiar candidatos e políticas públicas baseados na sua própria análise. A interação entre grupos de distintas ideologias costuma ser um indicador de saúde da democracia. Por isso, as redes sociais também precisam promover interações entre distintas bolhas.
Ação. Mais do que mero reflexo da sociedade, redes sociais podem atuar para transformá-la. Aumentar a resiliência de comunidades para que se recuperem de situações adversas como desastres naturais, de violência ou estado de calamidade pública.
Os diretores da Civic Signal apontam que maximizar o bem-estar individual de cada usuário não é o mesmo que maximizar o bem-estar do grupo. E esses sinais de saúde levantados são um bom parâmetro do que a sociedade pode começar a demandar do mundo digital. A dúvida que fica é se é possível incorporar esses princípios às plataformas já existentes ou se é necessário começar tudo de novo. Oportunidade para inovação é o que não falta.
Clara Becker é cofundadora do Redes Cordiais, projeto de combate à desinformação e aos discursos de ódio em redes sociais.
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